Inacabado

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Mais uma manhã entre tantas outras, onde eu sequer lembrava se tinha dormido ou não. A luz do sol entrava pela janela e transpassava as camadas finas de cortina branca estampada, cujos desenhos eram refletidos sobre a mesa da cozinha. Cozinha que lembrava cozinha de sítio, ou casa pequena interiorana. Devia ser cerca de sete horas da manhã. Eu me recordo de encarar o calendário-imã colado na geladeira e tentar lembrar sobre como eu tinha passado os dias anteriores. Doze meses, 366 dias. Ano bissexto. Os domingos eram marcados por tinta vermelha que inevitavelmente associei a sangue, que acreditei não estar mais correndo em minhas veias. Que associei a dor. Que associei a perda. Que associei a mim. Eu tinha me perdido e nada poderia doer mais do que isso. Que seja. Os sábados não tinham marcação especial, como se não houvesse nada de especial neles também. Será que dor tem limite? Porque se tiver, posso dizer que cheguei próximo, se não tiver chegado ao limite. Cheguei a ponto de desligar qualquer percepção sobre o ambiente a minha volta. Desliguei as minhas reações, desliguei a compaixão, desliguei o senso de justiça, desliguei tudo o que podia me trazer uma lágrima, e embora meu rosto estivesse molhado ao observar o calendário e buscar lembranças, eu posso lhe afirmar que não senti nada. Nem sei o porquê do choro. Meu corpo estava tão amortecido que eu poderia apanhar até a morte sem gritar. Acredito que aquela lágrima veio da ultima parte de mim que ainda podia sentir. Daquele lado escondido, como um estepe, em caso de querer retornar à vida. Era a minha ultima parcela de humanidade morrendo, mas antes, lamentando pela própria morte. Pela minha morte. Por um corpo que carregava um espirito sem vida. Era o luto ao perceber que a vida passava por mim, os dias se foram e se desfizeram como fumaça no ar. Passaram sem nada que os justificassem. Como se todo o tempo “vivido” até então, fosse perdido.

1 comentários:

Anônimo disse...

genial. Sem outras palavras pra definir o que escrever, prima, te amo ♥