Desde que você partiu.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Vez por outra sinto um alívio por você não estar tão presente, você certamente odiaria a vida que tenho levado. Lembro de um dia ter criticado você por uma música do Nirvana que você cantarolou no telefone. Eu sempre achei Kurt Cobain um idiota e, olha que bela contradição: Hoje eu entendo a idiotice dele, ao menos um pouco. Ou acho que entendo. Passei a noite ouvindo um acústico do Nirvana. Lembro do trecho da carta suicida de Kurt Cobain quando ele escreveu: "Devo ser um daqueles narcisistas que só dão valor às coisas depois que elas se vão. Eu sou sensível demais. Preciso ficar um pouco dormente para ter de volta o entusiasmo que eu tinha quando criança." Engraçado. Me identifiquei. Sou assim. As vezes me sinto até egoísta. Em um outro trecho a carta diz: "Existe o bom em todos nós e acho que eu simplesmente amo as pessoas demais, tanto que chego a me sentir mal." Eu sempre me entrego a tudo até com as forças que não tenho. Uso de tanta intensidade que frustro a mim e aos outros.

Você não gostaria de ver o quão grogue estou agora, ou enquanto tocava violão há uns dez minutos atrás. Você odiaria ver o quanto tenho sido auto-destrutiva. Odiaria o bar que eu frequento e odiaria ver a forma indecente como eu sorrio pro garçom enquanto bebo. Odiaria o meu tom de voz quando peço mais gelo no whisky, ou o meu tom de voz quando peço a quarta dose. Você odiaria ouvir o som do copo batendo na mesa. Odiaria ver um cigarro aceso entre meus dedos. Odiaria me ver voltando pra casa quase cambaleando e odiaria ainda mais me ver deitada no chão por horas olhando pro teto. Mas eu sei que nada te deixaria com tanta raiva quanto me ver fazer isso todos os dias e saber o quanto eu choro depois de tudo. E choro por mesmo depois de três anos, não ter parado de tomar aquele monte de comprimidos tarja preta. Eu te prometi, não consegui, mas olha, eu diminuí a dose. Lembro de quando você me disse: "São três da tarde e você está tomando CINCO comprimidos pra dormir. Você tem noção do grau de depressão em que chegou?" Não, amor, definitivamente eu não tinha. Se eu soubesse que você iria embora tão cedo, eu teria passado mais tempo acordada. E eu teria me empenhado mais em ser algo bom na sua vida, mas sabemos que não fiz. Não fui. Eu tentei, como aquela vez em que comecei a procurar emprego porque a gente queria casar, revirei todas as faculdades da cidade pra te ajudar com a transferência, mas nenhuma faculdade nessa maldita cidade tinha o seu curso... Agora tem. Eu poderia dizer que isso é bom, porque eu quero cursar a mesma coisa que você cursava, mas não é. Você não está aqui. Essa cidade poderia explodir que eu nem me importaria.

Não deixei de ser impulsiva, ainda sinto raiva com facilidade. Agora mesmo estou com raiva. Estou sóbria. Não sei mais estar sóbria e feliz ao mesmo tempo. Sempre achei feio mulher bebendo, falando palavrão e essas coisas. Hoje faço tudo o que sempre odiei. Simplesmente pra fugir dessa raiva que eu sinto por você ter morrido. Por eu não ter feito nada. Por eu ter perdido o meu tempo longe de você e por todas as vezes que brigamos. Você é um idiota. Não importa, você vai ser um idiota pra sempre, porque você enterrou a porra do meu coração com você. Sabe qual é a parte do dia que mais dói? Quando eu ligo para o seu número e aquela vagabunda da operadora do celular diz que "esse número de telefone não existe". Como não existe?! Há um ano atrás eu ficava 2, 3, 4 horas falando com esse número pra agora ouvir que não existe? Eu recebi mensagens que nunca apaguei desse número que agora, não existe. E eu faço isso todos os dias. Todos os dias eu ligo e tenho a esperança de você atender e dizer que era tudo uma brincadeira de mau gosto, mas a realidade sempre cai sobre mim como uma tempestade que estraga um domingo de sol na praia.

Desde que você se foi, nunca mais comi aquele doce que era o nosso favorito. Passei a torcer pro Atlético, porque você gostava do Cruzeiro. Eu faço pra te irritar, porque gosto de te imaginar torcendo o nariz pra mim ao me ver usando uma camisa do Atlético. Gosto de imaginar sua voz dizendo: "Não tenho namorada atleticana, sai daqui", gosto de pensar no beijo que roubaria.
Desde que você partiu, passei a beber aquela cerveja que você falava que era ruim. Eu sempre detestei cerveja, você sabe, mas bebo pra te contrariar. Bebo pra fazer birra. Faço tudo ao contrário do que você gostava, porque não quero lembrar que você gostava. Não vivo mais pra te agradar, não tenho mais nada que era nosso, você levou tudo junto e essa é a minha forma mais infantil de me vingar de você por você ter morrido. Droga. Eu não consigo mencionar isso sem chorar e sentir raiva. Eu sei que a culpa não é sua, mas eu te culpo mesmo assim, porque ter raiva de você é mais fácil do que confessar que as vezes choro de saudade e de dor por você ter me deixado aqui, por você não ter me levado junto. Esse mundo não é mesmo um lugar muito legal, não te merecia, eu sei. Mas eu não consigo mais pensar nessas coisas de casamento, de filhos, daqueles sonhos todos que a gente tinha e que apesar de parecer clichê, eu tinha certeza que seria diferente de tudo o que já passou por essa terra, porém você não conseguiu cumprir com a sua parte no acordo.

Quando alguém morre, quem fica aqui vivo geralmente faz as coisas que agradariam a pessoa que partiu. Eu não consigo. Eu faço o oposto de tudo, mas do meu jeito eu permaneço fiel. Quando me dizem pra te deixar "descansar em paz", eu recuso gritando. Por que eu deixaria? Você não me deixa descansar em paz. Você não me deixa amar ninguém da forma que eu amei você. Não me deixa sonhar mais com futuro. Não me permite criar expectativas de nada. E isso tudo sem dizer uma única palavra, somente por ter partido.

Eu não disse que te amava antes de você partir. Eu te liguei só pra te ouvir e fiquei muda, eu queria ter dito que te amava, se eu soubesse que era a última vez que estava ouvindo a sua voz, eu teria dito, mas eu não disse. Acho que vou carregar isso pra sempre. Tanto faz. Odeio você. Odeio muito. Se eu pudesse te trazer de volta a vida, faria isso pra te espancar até você não aguentar mais. Céus! Eu ia te arrebentar, cara! Mas não posso. Então vou seguir como der, levando a minha vida "meio punk, meio grunge", como você mesmo dizia. E se não der, ficarei estagnada no tempo. Acho que é exatamente isso que tenho feito. Não tenho muitas certezas hoje em dia.

Esse é o adeus que eu não pude te dar.

1 comentários:

Anônimo disse...

... de apertar o coração T_T